A boa culpa e a má inocência – Bert Hellinger

Cultivamos algumas idéias morais sobre a culpa e a inocência. Pelo nosso olhar, acreditamos que os inocentes são “bons” e os culpados são “maus”.

Isso, claro, não falamos daqueles que cometeram algo contra a lei e o convívio na sociedade. O que se fala neste texto é sobre o sentimento interno de culpa ou inocência nos nossos movimentos da vida.

Hellinger, em seus estudos e observações, traz um novo olhar para esses sentimentos, e explica como nosso valor em relação à culpa e a inocência pessoais podem estar invertidos na nossa significação.

Ele afirma que podemos fazer coisas consideradas ruins com sentimentos de inocência e fazer boas coisas com culpa, ou má consciência. Esses sentimentos estão ligados, primeiramente, ao nosso vínculo familiar.

A consciência familiar

Em nossos relacionamentos experimentamos a consciência. Em nossas ações, tudo que fazemos e que produz um efeito sobre o outro vem acompanhado de um sentimento interno de “culpa” ou “inocência”.

Aquilo que causa dano ao outro, experimentamos como culpa. Porém, se fizemos algo que favorece o outro, sentimos inocência.

Em nosso sistema familiar, estamos submetidos à cultura dessa família, e o que sentimos como danoso ou como um favor também se altera conforme aquilo que é praticado por esse sistema.

Isso significa que o que pode ser visto como negativo em um sistema pode ser considerado algo positivo ou incentivado em outro. Essa é uma das principais descobertas de Hellinger.

“O que podemos observar nas Constelações familiares em relação à consciência coletiva? Em primeiro lugar, que não excluamos ninguém, seja na nossa família ou na família do cliente e que procuremos na família dele e na nossa, pelos excluídos, olhemos para eles, com amor, em nosso coração. Podemos fazer isso somente se tivermos deixado para trás a diferenciação entre o bom e o mau.”

Bert Hellinger

Nosso padrão de culpa ou inocência interna está atrelado ao que é aceitável ou condenável pela nossa cultura familiar. Se seguimos de acordo com o que é aceitável em nosso sistema familiar, experimentamos isso como uma postura inocente, sem peso.

Porém, se vamos contra algum valor do nosso sistema familiar, sentimos isso como uma culpa, e também como algo pesado.

O desafio

Então, se olharmos para o nosso sentimento interno com esta informação, o que muda? Ou que nova informação podemos notar?

Um ponto interessante que Hellinger traz é que nossa evolução pessoal só é possível através do sentimento de culpa. Isso se explica pois para crescermos, temos que deixar para trás algumas coisas que aprendemos mas que não nos servem mais.

Devemos assumir um papel ativo de buscar uma nova solução. Diferente daquela que estava disponível para nós por meio do nossos sistema familiar. E aqui já reside um grande desafio: se abrir para o novo sem precisar desonrar o que estava disponível anteriormente, e que nos levou até aquele ponto, de uma nova possibilidade.

Sair do padrão estabelecido está atrelado em grande parte a lidar com a culpa que vem deste sentimento. Isso pois, nesse movimento, nosso interior sente isto como uma possível perda de pertencimento ao nosso sistema, pois estamos abrindo mão de algo.

Olhar para o que nos foi dado com respeito, e de forma verdadeira, é uma chave que permite este movimento de crescimento, em direção ao novo.

E a inocência?

Nesse olhar, Hellinger percebeu que se permanecemos “inocentes” perante nosso sistema familiar, não evoluímos.

Ficamos preso na continuidade do que sempre foi feito, mesmo que o resultado não nos agrade.

A inocência aqui atua como um garantidor do pertencimento. Logo, “decido não tomar as atitudes necessárias para não correr o risco de deixar de fazer parte.” É um pensamento infantil, reservado às crianças. Essas sim, inocentes em sua postura, corretamente.

Porém, é nos pedido mais em nossa fase adulta. Devemos pagar o preço do crescimento, e um dos custos é o sentimento de “culpa” atrelado ao processo.

Somente neste lugar podemos seguir para vida, olhando com respeito e gratidão de onde viemos. Aquilo que fez parte prepara a base para que o novo chegue.

Texto via Medium.com – João Neto